No Brasil, há algumas décadas
atrás, ter carro do ano era privilégio para a minoria. Esta minoria era a única
capaz de trocar de carro a cada lançamento de um novo modelo. Tanto que estes
lançamentos eram bem menos frequentes do que são hoje. Pois bem, a demanda
mudou e com ela veio a oferta: uma verdadeira batalha entre as montadoras num redesign constante de seus veículos.
Essas e tantas outras mudanças
que acometeram o comportamento de consumo nas últimas duas décadas são decorrentes,
principalmente, da reestruturação das classes sociais. Partimos de uma
estruturação piramidal e nos encontramos em um losango onde a fatia mais larga
é a classe média, que representa cerca de 100 milhões de brasileiros que cada
vez mais aprendem a consumir baseados não apenas em atributos básicos (como preço
e qualidade do produto), mas também em benefícios provenientes de outros
atributos como design, por exemplo, que representa a própria cultura na qual o
produto/serviço está inserido.
Uma prática que já é relativamente
antiga em alguns segmentos (como o automobilístico) e que começa a ganhar cada
vez mais força em novas áreas enquanto estratégia de entrega de valor para os
consumidores é o Branding Orientado ao
Design. Esta estratégia é resultante, a princípio, de uma postura de marketing
orientada às vendas e que se utiliza da ferramenta ‘design’ tanto para acelerar
o fluxo de estoque (pelo lado da empresa) quanto para entregar valor ao
consumidor (pelo lado do mercado).
Para entendermos melhor este
conceito vamos resgatar aqui um movimento ocorrido nos anos 20 e 30 do século
passado, nos Estados Unidos, denominado ‘American
Way of Life’ (lê-se: Jeito Americano de Ser ou Viver). Este movimento
surgiu como resposta à grande depressão pós primeira guerra mundial. Com o
incentivo do governo, o desenvolvimento industrial, o fácil acesso ao crédito e
outros incentivos (publicitários) criou-se nos EUA uma atmosfera propícia ao
consumo desenfreado (inclusive consumo de cultura). Este consumismo era entendido
como reflexo de um padrão de vida elevado.
O resultado desta prática é de
fácil previsão: a saturação do consumidor e a estagnação da economia. Mas, para
driblar essa possível estagnação, entrou em cena o tratamento dos produtos
enquanto representação de um contexto imediato. Ou seja, cada produto lançado
fazia referência ao ano de fabricação, levando-se em conta o design como a
principal característica ‘temporizadora’ do consumo. A intensão era que no ano
seguinte este produto estaria obsoleto e novos modelos o substituiriam,
fomentando assim o consumo constante.
E assim sobreviveram por todo
esse tempo as indústrias da moda, dos eletrodomésticos e eletrônicos, das
montadoras de veículos, dentre outras.
No Brasil esta prática demorou um
pouco mais para se consolidar visto que o país teve desenvolvimento econômico mais
brando que o colega norte-americano. Contudo, com a reestruturação atual das
classes sociais, a prática do branding
orientado ao design passou a encontrar cenário pertinente para se desenvolver.
Prova disso é a quantidade de
lançamentos de carros com redesign,
além de novos modelos e portes variados que visam atender uma gama cada vez
maior que consumidores ávidos por novidades. Neste cenário a qualidade –
decorrente do desenvolvimento tecnológico – entre as montadoras é cada vez mais
equivalente e muitas vezes a briga se define embasada em design. Ou seja, o
design é cada vez mais uma ferramenta utilizada para gerar vendas e
competitividade.
Os segmentos menos recentes que
investem cada vez mais nessa prática são os fabricantes de aparelhos de
telefonia celular (os smartphones)
que fixaram periodicidade anual para seus lançamentos. Neste segmento o design
leva muito mais em conta a usabilidade e precisa entregar ao consumidor mais que
aparência. Deve entregar um produto que teve seu design pautado na entrega de
experiência por meio da interface com a qual o usuário vai interagir de acordo
com suas necessidades diárias. Isto significa que o design não anda mais
sozinho e nem se limita à estética.
QUEM GANHA E QUEM PERDE?
O consumidor. Ganha porque recebe
produtos cada vez mais elaborados, funcionais, que otimizam a experiência de
uso. Perde porque a geração de lixo eletrônico e o uso cada vez maior de
recursos naturais acabam impactando na sua qualidade de vida.
De uma forma ou de outra, seja
pelo status que um carro novo proporciona ou pela pertinência da usabilidade
dos smartphones, as empresas cada vez
mais entendem que investir em design como estratégia de gestão de marca é uma das
principais vias de entrega de experiências para o consumidor. Este tem sido um
dos caminhos mais viáveis para entregar ao consumidor ou cumprir, por meio de
experiências, aquela promessa que sintetiza o posicionamento delas enquanto
marcas. E dessa forma possam se tornar relevantes para a sociedade de consumo e
garantir sua perenidade.